Eu sempre achei que a eleição para presidente de 2018 está sendo parecida com a eleição para presidente de 1989. Já li diversas analistas bem conceituados de política desfazendo essa relação. No entanto, para mim é claro que revivemos uma situação muito parecida. O que é péssimo, porque é um sinal de imaturidade e ignorância nossa. Parece que nos últimos 30 anos andamos para frente, mas levamos apenas um segundo para andarmos em círculo e voltarmos ao mesmo ponto.
Procurando pelo copo meio cheio, encontro várias maneiras de nos vermos hoje em melhor situação do que ontem. Em primeiro lugar, não se tem mais os mesmos quase mil por cento de inflação que tínhamos então (916% ao ano, para ser exato). Expectativa de vida era menor, contas públicas eram mais bagunçadas, bancos estaduais garantiam a farra de governadores irresponsáveis e o sertanejo cafona imperava nos rádios – bem, Marisa Monte chegava no cenário, o que me permitia sonhar…
Ao olhar o copo meio vazio, vejo um país economicamente parado, letárgico e paquidérmico demais para sair da marcha lenta, com um mercado interno gigante que achou que tinha chegado a sua vez e deu com a cara na parede, educação pública cada vez mais atrofiada por desvios até na merenda. Vejo um país bi-polarizado que insiste em olhar no retrovisor para buscar o futuro. E mulheres fazendo som e sucesso cantando comportamentos masculinos de “eu sou mais eu”.
Ontem, como hoje, há medo de um dos candidatos ganhar a eleição. Quem é contra Bolsonaro se assusta com a possibilidade da arma, da agressão, do vitupério e da mentira se tornarem o modo como os brasileiros conversarão a partir de 2019. Quem é favor de Bolsonaro enxerga nele o salvador capaz de reverter tudo o que foi feito no país nos últimos 15 anos – e neste tudo só há coisas ruins, nada digno de ser mantido. Há uma fenda clara e profunda dizendo que para um lado está o certo e para o outro está o errado. Tanto o medo quanto a expectativa de salvação inspirados hoje por Bolsonaro são a mesma medida do que era inspirado por Lula ontem.
Lula era o sapo barbudo que botava medo nos empresários, que seriam 800 mil a fugirem para os EUA caso ele ganhasse. Botava medo também num certo estrato de classe média que dizia que um sem-terra viria dormir na sua cama depois da vitória. Ao mesmo tempo, inspirava em muita gente a esperança de espantar as moscas que voavam sobre o filé mignon governamental desde Cabral. Lula perdeu, perdeu, perdeu e perdeu mais uma vez até ser eleito depois de aparar a barba e cortar os ternos em tecido italiano com grife. Aí, fez uma coisa e não fez outra. Ou fez outra, mas não fez uma; há divergências e cada um liga os pontos como prefere.
As linhas deste desenho separam e isolam a nossa sociedade. Vejo pessoas do lado de fora e vejo pessoas do lado de dentro. Vejo pessoas que não queriam estar em nenhum lado e só gostariam de adormecer hoje e acordar amanhã. Vi tudo isso ontem, em 1989. O Brasil que vivi em 1990 não foi legal. O Brasil que viverei em 2019 é assustador. Cadê o som da Marisa Monte?